(Notas sobre o filme).
No filme The Zookeeper, num primeiro momento, parece que teremos a velha metáfora: guerra humana é a volta à animalidade. Mas, aos poucos, vamos vendo que o autor conseguiu ir um pouco mais longe. Nem tanto, mas foi…
Guerra civil num país do Leste Europeu. Um sujeito, ex-agente de polícia de Estado – daqueles responsáveis por dedurar as pessoas -, é um zookeeper. Abandona a família e vive isolado num zoológico, na companhia dos animais. O silêncio complacente dos bichos se contrapõe às censuras dos colegas que sabem de seu passado imoral.
A guerra começa. Ele resolve ficar sozinho cuidando dos animais. Até que chega uma criança e, mais tarde, uma mulher, mãe dessa criança. O menino viu seu pai ser morto. Foge e se arma. Assustado com tudo e todos, aos poucos faz amizade com o sujeito do zoológico. O menino faz amizade com os lobos – aqui estamos bem próximos de Plauto e Hobbes, como sempre. A loba está grávida.
Um grupo de combatentes invade o zoológico num determinado momento. Alguns animais são levados para servirem de alimentos. Esse grupo se autodenomina “os jovens leões”. Tiram uma foto com um leãozinho. E o levam.
Esse é um dos pontos a marcar: a nomeação permanente do sujeito ou de grupos a partir de uma metáfora-animal. Os falcões, os leões… A metonímia da força, da agilidade… não importa. O que mecanismo parece ser o mesmo: o animal aparece para recalcar uma certa operação pulsional – algo que, justamente, é o contrário do instinto. Um grupo de exército “ferozes como leões”. Não há nada da violência leonina aqui.
Numa cena , um desses soldados “leoninos” é baleado pelo menino. Seu cadáver é levado até às grades altas da jaula do leão. Num salto impressionante, o leão pega o corpo e o leva para baixo.
Numa outra cena, o veterinário do zoológico é enforcado por esse grupo de soldados. O veterinário parecia ser de uma outra etnia. E a guerra civil parece ser daqueles motivadas por motivos ideológicos-étnicos.
As duas cenas mostram bem a diferença entre uma violência (a fome, o território etc.) e a outra (ideologia, diferença da pele etc.). São violências que se distanciam imensamente. O que eu quero apontar é que o animal aparece para recobrir a segunda. A violência humana é dita animal quanto mais humana (pulsional) ela é.
Última cena que quero comentar: a mulher que chega no zoológico está marcada atrás do pescoço. Trata-se de uma tortura imposta pelo soldado do campo de concentração onde ela estava. Depois de estuprar as mulheres, ele as marcava com um X na nuca “para que elas nunca se esquecessem”. É difícil imaginar algo mais cruel. Mais uma vez: isso não aparece no campo animal. Estamos no campo da violência, do sadismo, do pulsional. Não se verá um leão torturando uma zebra, nem violentando girafas. A violência do bicho é específica, bem previsível. Ao contrário do humano que, nesse caso, faz permanecer ao longo do tempo, na marca-cicatriz imposta na tortura.
No final do filme, o menino leva um dos lobinhos no colo. Tanto ele quanto o lobinho sobrevivem aos ataques da guerra. E ao que parece, o zookeeper descobre que pode recomeçar.
O filme é fraco, mas serve pra discutir a questão do animal. A partir disso que Derrida chamou animot.